domingo, 29 de março de 2009

O menino do ponto

Ônibus 613. 22h00min. Sentada na mesma cadeira, a última do ônibus e individual. Abro a janela e junto com o vento vêm os tantos pensamentos, reflexões e observações internas sobre as pessoas que vejo, sobre mim, sobre o mundo. É, mais um dia, até chegar naquele ponto. Até então só reinavam pensamentos soltos, alguns até sem sentido, mas daquele ponto em diante, todo pensamento se prendeu àquele olhar perdido.

O frio e a vontade de chegar em casa e me cobrir passaram quando eu vi aquela criança ali, deitada no chão, usando um degrau de loja como travesseiro. Sem pai, sem mãe, só com céu como garantia de companhia, esfregando o olho na tentativa de pegar no sono, na tentativa de dormir e acordar num mundo diferente, àquele mundo que toda criança tem direito de ter, um mundo de presentes, de travessuras, de doces, de surpresas, de desenhos animados, de bagunças, de festinhas temáticas, de beijos, de abraços e de muitos: Eu te amo! O mundo dos inocentes que aquela criança nunca teve o direito de conhecer.

O meu olhar sobre mim se perdeu quando olhei para ele e de uma forma súbita e instantânea aquele olhinhos pequenos entraram em mim de forma esmagadora. E, na tentativa de me aproximar, coloquei a cabeça pra fora da janela e ele olhou para mim – sim, ele olhou! Mas, eu não sabia o que dizer, não sabia o que poderia fazer ou dizer para que pudesse mostrar que ele era importante, então, quando o ônibus começou a andar, o olhar dele permaneceu em mim e eu no dele. E na tentativa de esboçar algo antes de perder aquele olhar, eu sorri e acenei e ele fez o mesmo.

Depois daquele ato a dor no meu peito aumentou. Eu deixei o meu sorriso e o meu aceno, quando deveria ter deixado o meu Deus. Eu não sei o que ele entendeu com aquele gesto, mas eu queria dizer: Hei, você não é invisível, você é lindo, você é querido! Esperei o dia seguinte, e no mesmo ritual sentei na cadeira esperando aquele ponto novamente, mas o menino não estava mais lá. Então, logo deixei de pensar e segurei o choro. Dali em diante nunca passo pelo ponto sem lembrar daquele menino e do olhar que ele deixou em mim e pensando no que eu deixei dentro dele.

É impossível dobrar o joelho e não lembrar do menino do ponto e junto com ele a representação de tantas crianças que nasceram sujeitas ao domínio cruel do mundo. Antes de dialogarem com Deus, pensem no que você tem deixado para aqueles que precisam tanto de um colo de um Pai. O que você tem dado? Vamos deixar mais que um sorriso e um aceno de mão, deixem o Deus que há dentro de você, pode ser sua única chance.

10 comentários:

  1. Wellington12:00

    Pois é, uma representação clássica do comodismo cristão. Que essa sutil apresentação da dificuldade de muitas pessoas nos comovam tanto, ao ponto de nos fazer perceber a necessidade de falar de Deus, lembro-me daquele homem na porta Formosa, onde Pedro e João, viram que era necessário falar de Deus, pois dar esmolas e não se importar em realmente resolver o problema das pessoas é fácil, difícil é se comprometer a falar de Deus, e procurar ininterruptamente saber se nosso argumento nesta tentativa foi forte o suficiente para convencer às pessoas que Deus é muito melhor que qualquer esmola, que Ele não resolve o imediatismo de nossos problemas, mas sim, traz a solução pra vida toda. Fê, estupenda história, estarei orando por esse menino e por tantos outros.
    A cada dia minha admiração por você aumenta mais.
    Abraços!!!

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  2. Diego Bruno12:03

    "Impressionante" é o que eu diria, caso fosse possível expressar o valor do que acabo de ler. Sinceramente, eu não comento em muitos blogs, eu não expresso minhas opiniões particulares assim, mas é preciso registrar aqui que por mais que eu faça o trabalho do evangelismo, por diversas vezes pela noite à dentro, por mais que eu evangelize crianças, jovens, adultos e idosos, eu sei que o que mantém isso vivo em mim é Deus e "aquele olhar", cujo o mesmo conheço bem.

    Deus te abençoe, e obrigado por este lindo presente.

    » Diego Bruno

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  3. Juan12:09

    texto lindo!!! profundo!!! verdadeiramente uma mensagem para todos nós, cristãos ou não.

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  4. Diego Sarcinelli12:10

    Nanda, adorei essa história, me lembra um livro chamado "Homens invisíveis: relatos de uma humilhação social", acho q vc iria gostar.

    Parabéns, ficou ótimo.

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  5. Paulo12:12

    Realmente, lindo o texto, e isso me fez lembrar um livro que li "Filhos de ninguem", e no qual cita que as pessoas,tão preocupadas,tão centradas em seus problemas, que passam por esses garotos e não os veem, até certo ponto é como se fosse invisivel para a maioria de nós.

    e como ja foi dito, lindo o texto mesmo.

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  6. Lucas12:20

    Fê, belíssimo texto. Português perfeito, colocação perfeita e o seu sentimento o mais lindo e perfeito que existe, tanto que chega a transmití-lo para nós, fazendo-nos ser assim tbm. Adoro vc, mocinha faladeira cheia de Deus! Fale mais, escreva mais, fale mais, escreva muito mais... Porque Deus diz tudo em vc. Um grande abraço!

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  7. Junior (Robs)07:30

    Este é o clamor do Espírito Santo e daqueles que de Deus nada ouviram....
    Precisamos atender a este chamado, e levar, através do nosso viver, a os que estão morrendo Aquele cujo nome é ESPERANÇA.
    A Esperança das nações, o Amor e a Paz que ultrapassa o entendimento do homem....
    Que este seja o clamor de todos nós, que já temos o conhecimento e recebemos diariamente o Amor de Cristo...
    É hora de exalarmos deste perfume suave e levar alimento aos famintos e pequeninos...

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  8. Muito bom teu texto, prima. Legal conhecer mais esse teu lado. Um beijo

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  9. Olá Fernanda!
    Seu texto é iluminado pela luz de Jesus!
    Muito bom de ler!
    Tchau!

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  10. Este texto não só me fez pensar na atmosfera global que tem reinado em vida humana, mas a própria miserabilidade de um povo[leia-se a humanidade] que supostamente possui o controle da natureza, da ciência, da agricultura, da economia, da paz mundial mas não possui a humildade de reconhecer que o ser humano não precisa do mundo e sua eloquência social, espiritual, religiosa, mística, mas tão somente de Amor, Solidariedade, Compaixão, Perdão, Aconchego, Alegria, Paz e toda plenitude que só há em Jesus. O sua atitude Fernanda, me fez lembrar os amigos de Jó, prantearam por ele 1 semana, em silêncio, no âmago da alma, não havia palavras ou reações, somente um grito avassalor de misericórdia, a intercessão silenciosa...''chorar com os que choram, se alegrar com os que cantam''. O teu sorriso e aceno Fernanda, talvez tenha sido muito pouco conforme a Graça que há em ti, que há da porção de Jesus em ti, mas em amor, se tornou o bastante pra acolher aquela alma, representar o olho de Deus para aquela criança e quem sabe, ser o refrigério intrépido de uma vez na vida, sentir a sensação que Deus está com os pequeninos.
    Deus te abençoe!

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